Adjunto epistolar

Dois leões de fome e juba chegaram de supetão à casa da avó. A mesa não tinha essa fartura toda. Era-lhes, porém, suficiente. Vó Isabel repara nos meninos famintos e cabeludos e selvagens. Compadece-se. Vai até o quarto. Volta, então, com um bilhete metido num envelope feito ali mesmo, às pressas. Dá-o na mão do mais velho. “Entregue à sua mãe. Não abra”, recomendou. Os meninos se despedem e saem. Já em casa, o mais velho estende o envelope à mãe. “Vó mandou”, diz. A mãe abre. Dentro, uma cédula de 5 reais e um bilhete:

“PA CORTA U CABELU DUS MININU”

O mais velho, que na ocasião engoliu o choro, mais tarde descobriu, já mais sabidinho na gramática da vida, que esteve diante de um adjunto epistolar (essa nova nomenclatura gramatical!), do qual aquela cédula era apenas a sua encarnação: o amor. O incomparável amor de vó.

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